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quarta-feira, 20 de junho de 2012

SABENDO UM POUCO DA VIDA DELE



Domingo passado fui ao cemitério pela segunda vez em pouco mais de um ano.
É muito revoltante imaginar que você está ali embaixo.
Reafirmei minhas promessas a você e saí logo dali.




Na sexta-feira anterior, passei em frente a casa onde teu assassino morava.
Claro que sei que ele foi embora daquela casa logo depois do que aconteceu, mas tinha uma senhorinha parada no portão e não resisti.
Nunca vi aquele portão aberto, então, me senti no direito de falar com ela.
E fui.
Não me apresentei no início, apenas perguntei se o Jair se encontrava na casa.
Ela, mesmo sem saber quem eu era, e sem saber que eu já sabia que ele não estava, começou a me contar coisas.
Uma senhorinha com aparência cansada, comportamento de quem viveu num sítio a vida toda, extremamente humilde e sem maldade no coração.
Desembestou a falar.
O que eu, mãe da Bianca, sei sobre o cara que a matou, além do pouco que postei aqui?
Nada!
Pois, eu e a senhorinha, conversamos por longo tempo naquele portão:

- Não, filha, o Jair não mora mais aqui desde que aconteceu aquilo.

- Aquilo o que?

- Desde que ele matou a menina lá de cima.

- Ah, sim... E a senhora é parente dele?

- Não, ele morava lá nos fundos, assim eu não ficava sozinha aqui. Ele era amigo dos meus filhos desde menino. Depois que ele matou a menina lá de cima, foi embora porque ficou com medo.

Não achei honesto não me identificar, então falei:

- A senhora tá me contando coisas... A senhora me conhece? Já me viu por aqui?

- Não, 'fia'.

- Meu nome é Gabriela, e sou a mãe daquela menina que o Jair matou. Aquela menina se chamava Bianca, e este era o rosto lindo que ela tinha (mostrei a foto no meu celular).


Ela levou as mãos ao rosto, soltou um "meu Deus do céu", um "minha Nossa Senhora" e um "que tristeza isso".
Continuamos a conversar por um bom tempo depois disso, mas agora ela sabia com quem estava falando.
Disse a ela que eu já sabia que ele não estava lá quando puxei conversa, mas que queria saber um pouco sobre ele, já que ninguém nessa merda de lugar parece saber de porra nenhuma.
Perguntei se ele bebia e ela disse:

- Beber, ele não bebia não senhora. Eles são de família de bem, mas o Jair sempre teve uns 'probleminhas de cabeça'...

- Como assim?

- Ah, não sei explicar direito não senhora, mas às vezes ele tava bem e, de repente, dava uns ataques nele. 'Problema de cabeça', a senhora sabe como é, né?

- Não, não sei. A senhora sabe dizer se ele tomava algum remédio pra isso?

- Sei não. Mas ele tinha uma mania esquisita com leite. Naquele dia, ele tinha saído pra comprar leite. Pra ele, podia ter a comida que fosse, mas ele tinha uma cisma com leite! Se não tivesse a quantidade que ele achasse suficiente, parecia que tava passando fome. Falaram pra ele não sair pra comprar, que não precisava, mas ele saiu daqui feito um louco, pegou o carro e foi. Na volta, aconteceu o que aconteceu.

- A senhora sabe se naquele dia ele estava com aquele 'probleminha de cabeça'?

- Sei não, fia... Eu mesma só fiquei sabendo que tinha sido ele que tinha matado a menina três dias depois, porque uma vizinha veio me contar.

Bom, aquilo não era um interrogatório. Ela me contou coisas sobre a vida dela, contou que entraram na casa e quebraram tudo uns dias depois e que ela estava sozinha à noite, morrendo de medo que fosse assalto...
Disse que os pais do desgraçado fizeram a mudança dele aos poucos, com o carro da mãe dele.
Comentamos sobre a mãe, irmãos e pai dele. E, pra minha surpresa, quando falei que o pai dele era novo, ela me disse:

- É fia, ele era novo sim, mas ele morreu uns tempos depois daquilo.

- Ele era doente? - perguntei

- Não, não tinha doença não. Deve ter morrido 'dos nervos'. Fiquei sabendo que ele tava sentado, o corpo foi caindo pra frente e, quando acudiram, já tava morto. Morreu foi de desgosto mesmo do que o Jair fez, de ter matado a menina.

- É, pra senhora ver... Se foi isso mesmo, ele acabou matando duas pessoas. Queria que fosse ele no lugar do pai, porque o pai, a mãe, a filha, nenhum deles teve culpa, né?

- Verdade, 'fia'...

E, assim, 'assuntei' sobre seu algoz.
Há quem diga que havia uma mulher e uma criança com você no ponto de ônibus aquele dia.
Pessoas estas que, se realmente estavam ali, tiveram a sorte de escapar com vida, mas que não tiveram a coragem e a humanidade de me procurar para contar o lado da história que nunca vou saber.





"Amor, não quero que se aborreça com minha tristeza.
Se é verdade essa ladainha de que quanto mais tristes ficamos, mais triste você ficará 'do outro lado' (se é que esse outro lado realmente existe...), trate de aprender a me ignorar, porque eu não consigo passar um dia da minha desgraçada vida sem chorar por você.
Nossa ligação era como um 'nó de marinheiro', por isso não consigo desatar essa dor que me bota no chão.
Te amo um amor que não cabe mais em mim..."